EFICIÊNCIA DOS HOSPITAIS ESTADUAIS DE SANTA CATARINA: UM COMPARATIVO ENTRE MODELOS DE GESTÃO

Antonio Felipe Oliveira Rodrigues1

Silvio Bhering Sallum2

Fabiano Maury Raupp3

Resumo: O artigo analisa a eficiência dos serviços de saúde prestados pelos 18 hospitais estaduais de Santa Catarina nos quais a gestão é feita diretamente pelo Estado ou por Organizações Sociais de Saúde (OSS). Empreendeu-se uma pesquisa descritiva, por meio de um estudo documental, com abordagem quantitativa. Os dados obtidos na Secretaria Estadual da Saúde foram analisados por meio da Análise Envoltória de Dados (DEA) em três estágios, conforme é usualmente feito na literatura sobre o tema. Os resultados demonstram que os hospitais geridos por OSS são mais eficientes, sendo que 60% deles atingiram escore máximo em 2017 e apenas um hospital da administração direta atingiu o mesmo índice. Evidências atribuem a evolução na eficiência dos hospitais à melhoria na eficiência técnica (5,4%), ou seja, aspectos internos da produção. No entanto, verificou-se uma redução da eficiência tecnológica ao longo dos anos (2,2%). Por fim, a análise de dados em painel constatou um aumento médio de 1,9% na produtividade total dos fatores nos hospitais analisados durante o período investigado. A originalidade do estudo é reconhecida diante da escassez de trabalhos desenvolvidos sobre a temática em tela. Neste sentido, e entendendo pela importância dos resultados obtidos, recomenda-se a aplicação do modelo de gestão das OSS para os outros hospitais.

Palavras-chave: eficiência; hospitais públicos; modelos de gestão.

SANTA CATARINA’S STATE HOSPITALS’ EFFICIENCY: A COMPARISON BETWEEN MANAGEMENT MODELS

Abstract: The article analyzes health services’ efficiency provided by the 18 state hospitals of Santa Catarina in which the management is done by the government itself or by Social Health Organizations (OSS). A descriptive research was carried out, through a documentary research, with a quantitative approach. The data obtained in the State Health Department were analyzed through a 3-stage Data Envelopment Analysis (DEA), as it is usually done, according to the literature. The results demonstrate that the hospitals managed by OSS are more efficient, with 60% of them reaching DEA’s maximum score in 2017 and only one state administration hospital reached the same rating. Evidences attribute hospitals’ efficiency evolution to the improvement in technical efficiency (5.4%), that is, internal aspects of production. However, there has been a reduction in technological efficiency over the years (2.2%). Lastly, the panel data analysis found an average increase of 1.9% in total factor productivity in the hospitals analyzed during the period under study. The originality of the study is recognized in view of the scarcity of works developed on the subject on screen. In this sense, and understanding the importance of the results obtained, it is recommended to apply the OSS management model to the other hospitals.

Keywords: efficiency; public hospitals; management models.

INTRODUÇÃO

A ineficiência dos gastos públicos em saúde no Brasil é um dos principais problemas do sistema, juntamente com a falta de recursos, considerando que, de acordo com estudo da Organização Mundial de Saúde (OMS), cerca de 40% dos recursos disponíveis para o setor da saúde na América Latina é desperdiçado. Em relação ao subfinanciamento, ela ocorre no SUS sobretudo ao se comparar o gasto público em saúde per capita brasileiro com o de países que propõem serviços de atenção à saúde similares ao SUS, como acontece em alguns países europeus (Marques & Mendes, 2012). No entanto, Lisboa e Scheinkman (2017) apontam que há uma excessiva discussão sobre o total dos gastos (geralmente para o aumento destes) nos serviços públicos, porém pouca discussão sobre a sua eficiência.

Cabe aos gestores públicos uma alocação eficiente dos recursos na saúde a fim de reduzir custos desnecessários e evitar desperdícios, de modo a ampliar a oferta de serviços de saúde tanto demandados pela população. Uma das formas de aperfeiçoar a utilização dos recursos financeiros, de infraestrutura e de profissionais é por meio de medidas que possibilitem o aumento da eficiência dos estabelecimentos que prestam serviços hospitalares, sem que isso acarrete em redução da qualidade do serviço prestado aos pacientes. Os hospitais absorvem cerca de 70% dos gastos públicos com saúde e, segundo La Forgia e Couttolenc (2008), não figura no debate qualquer discussão a respeito do custo e da eficiência dos serviços hospitalares. Uma das razões para isso é carência de levantamentos na área. Os autores afirmam que o baixo desempenho dos hospitais brasileiros é ainda pior em unidades que atendem à população carente. Nestas, a baixa qualidade do atendimento é sempre notícia, a produtividade é minada pela ineficiência e a falta de prestação de contas.

O modelo de Organização Social de Saúde (OSS) foi criado com o intuito de publicizar serviços de relevância pública, até então prestados pelo Estado, que passaram a ser considerados não exclusivos da administração pública, a fim de alcançar maior eficiência e menor custo. Ante o exposto, estaria o modelo de OSS do Estado de Santa Catarina garantindo maior eficiência, possuindo melhor desempenho dos serviços hospitalares prestados em relação às unidades de saúdes geridas diretamente pelo governo estadual? O objetivo da presente pesquisa é analisar a eficiência dos serviços de saúde prestados pelos 18 hospitais estaduais de Santa Catarina, nos quais a gestão é feita diretamente pelo Estado ou por Organizações Sociais de Saúde. Entende-se que a eficiência está relacionada à combinação ótima de recursos em um processo produtivo, visando a potencializar resultados (Silva & Crisóstomo, 2019).

As OSS vêm conquistando espaço e adesão em diversos entes da federação como forma de prestar o serviço público, principalmente nos serviços de saúde. Devido a existência de metas, aferição de desempenho e participação das partes interessadas, em especial a sociedade civil, este modelo de gestão tende a trazer maior resultado. Para Tonelotto et al. (2019), como se deseja identificar o modelo que melhor utiliza os recursos públicos mas não se pode avaliar seus resultados, a eficiência, que aborda a relação custo/benefício entre recursos e produtos, torna-se uma razoável alternativa a análise comparativa entre ambos modelos. Portanto, sobre o prisma de oportunidades, vê-se a partir de uma análise comparativa a possibilidade de identificar o modelo que melhor gera eficiência.

O estudo se restringe a analisar os 18 hospitais estaduais catarinenses em que a gestão é estadual ou realizada por OSS, ficando a pesquisa relacionada à quantidade de procedimentos hospitalares que é realizado por cada um deles dada a quantidade de insumos que possuem. Dentre estes insumos, que durante o trabalho também serão denominados como inputs, destacam-se a quantidade de leitos disponíveis, quantidade de profissionais de saúde, recursos financeiros disponíveis pelo Estado, despesas com folha de pagamento, entre outras variáveis candidatas a explicativas na determinação da eficiência de cada unidade hospitalar. É importante destacar que há mais hospitais estaduais, nos quais o modelo de gestão é terceirização do serviço a organizações filantrópicas e sociedades beneficentes. Por motivos de delimitação da pesquisa, estes não estão inseridos no escopo do trabalho.

2 MODELOS DE GESTÃO NA SAÚDE

La Forgia e Couttolenc (2008) observam que nos últimos cinquenta anos, diversos tipos de arranjos organizacionais para hospitais foram testados no Brasil, com diferentes graus de autonomia, obrigações e metas a serem cumpridas, que respondem de forma distinta aos incentivos. No Brasil, a forma mais comum de administração pública hospitalar é realizada diretamente pelo Estado. No entanto, diversas formas de organização foram testadas ao longo do tempo, o que mostra o descontentamento com o modelo mais tradicional. Uma das razões para estas tentativas é evitar as restrições e a rigidez impostas pelas regulamentações do setor público no que diz respeito à administração de recursos humanos e compras (La Forgia & Couttolenc, 2008).

Apesar de os arranjos institucionais serem distintos, as formas indiretas e autônomas de gestão objetivam contornar a rigidez da administração direta e proporcionar flexibilidade e autoridade para os administradores. Algumas formas conseguiram atingir melhor o objetivo do que outras devido a suas características específicas. O regramento das OS (Lei Federal No. 9.637/1998) possibilita esta flexibilidade e autonomia ao serviço público, permitindo aumento da eficiência e qualidade, com o fomento do Estado, o qual tem o dever de controlar os resultados via contrato de gestão preestabelecido, que determina metas de desempenho e aporte de recursos necessários para execução das atividades pactuadas (Coelho, 2012).

Este novo instrumento de controle para a realização de serviços públicos – o Contrato de Gestão – viabilizou a delegação de atividades-fim à OSS, sem que o Estado ficasse desobrigado da responsabilidade de garantir o serviço, realizado por meio da fiscalização, do controle e verificação dos resultados obtidos em ações executadas por terceiros (Bresser Pereira & Spink, 1998). Cabe destacar que o contrato de gestão é distinto de um contrato administrativo comum. Enquanto este prevalece a vontade do poder público, aquele se assemelha mais a um acordo operacional, pelo qual a administração direta estabelece, em conjunto com os dirigentes da entidade contratada, o programa de trabalho com a fixação de objetivos, prazos, critérios de avaliação e desempenho.

Os regulamentos referentes ao processo de compras, pessoal e administração financeira são próprios e devem constar no contrato de gestão, porém, as OS devem prestar contas anualmente dos recursos públicos disponibilizados. Servidores estatutários podem ser disponibilizados pelo Estado para as OS, bem como é possível a contratação de profissionais com vínculo ao regime da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT). É importante destacar que os contratos das organizações sociais deverão ser avaliados periodicamente por comissão de avaliação composta por representantes do Legislativo, do Executivo e do Conselho Estadual de Saúde, tendo a responsabilidade de analisar os resultados alcançados. Tais critérios estabelecidos em Lei demonstram que as OS adotam um modelo que garante maior governança, feita por meio de metas e indicadores de desempenho. Esta é uma forma indireta de controle fundamental para gerir instituições complexas, em que os resultados desejados são previamente fixados. Sistemas de monitoramento medem o desempenho, confrontando-o com as especificações iniciais e mecanismos de feedback são ligados ao desempenho medido (Bevan & Hood, 2006)

Ferreira Junior (2003) afirma que o modelo de administração de hospitais públicos por OSS concede os mesmos instrumentos de gestão disponíveis na administração privada. Em compensação, seus dirigentes arcam com maiores responsabilidades em suas decisões. De acordo com Mendonça (2008), a transferência de competências para as OS tem o intuito de dar maior autonomia e flexibilidade na gestão dos órgãos, sem retirar as responsabilidades de seus dirigentes, haja vista que o Estado continua como financiador das atividades e fiscalizador. Tonelotto et al. (2019) discorrem sobre os argumentos dos favoráveis à gestão feita pelas Organizações Sociais (OS): expertise em gestão, agilidade no funcionamento e qualidade no serviço; modelo de financiamento que permite a autonomia gerencial e garante o custeio das metas estabelecidas; formato com capacidade para incorporar as melhores práticas de gestão de cada campo.

Jakab et al. (2002) e Hardin e Preker (2003) desenvolveram um marco teórico que considera cinco dimensões no âmbito organizacional que podem ser comparadas nos diferentes modelos de gestão hospitalar (Quadro 1), sendo que classificação parte de “muito limitada”, denominação da pior situação, até “alta”, que é o melhor nível possível.

Quadro 1: Comparação entre os modelos de gestão pelos componentes organizacionais

Componente organizacional

Administração direta

Organizações Sociais de Saúde

Autonomia decisória

Muito limitada

Alta

Exposição ao mercado

Muito limitada

Moderada

Prestação de contas

Muito limitada

Alta

Condição de requerente residual

Muito limitada

Alta

Funções sociais

Implícita

Explícita

Fonte: Hardin e Preker (2003).

Em relação à autonomia decisória, a administração direta está sujeita a total controle hierárquico, além dos gestores e funcionários estarem mais suscetíveis a sofrer influência política. Tal condição é mais difícil de estar presente nas OSS, que possuem capacidade decisória para definir sobre os recursos e as contratações, têm liberdade para inovar a administração e tomam as próprias decisões de investimento (Jakab et al., 2002; Hardin & Preker, 2003).

Sobre a exposição de mercado, a administração direta é financiada de acordo com orçamento histórico, diretores são escolhidos politicamente e o sistema de pagamentos é distorcido. As OSS, por sua vez, têm moderada exposição ao mercado por serem financiadas pelo orçamento global, que é vinculado à produção de acordo com o contrato de gestão; negociam com fornecedores os recursos necessários e, geralmente, não podem vender os serviços (Jakab et al., 2002; Hardin & Preker, 2003).

No âmbito da prestação de contas, os hospitais da administração direta possuem centros de supervisão hierárquica, porém as metas são pouco especificadas, não há uma orientação para resultados e a mensuração da satisfação dos pacientes é falha. Nas OSS, os gestores escolhidos são supervisionados pelo conselho estabelecido, porém de forma irregular. Não obstante, há forte orientação para resultados via contrato de gestão e mecanismos que vinculam pagamento a desempenho; e o foco está em produção, qualidade e desempenho (Jakab et al., 2002; Hardin & Preker, 2003).

A condição de requerente residual, na administração direta não está presente, pois não se retém a renda não aplicada do orçamento e as perdas de gestão são transferidas ao governo. Por outro lado, nas OSS este aspecto é atendido, a organização pode reter parte do orçamento não utilizado e investir em melhorias, além de que no caso de perdas, estas não são automaticamente transferidas ao governo. No caso de investimento em melhorias, caberia fiscalizações por entes responsáveis para confirmar o bom uso do dinheiro (Jakab et al., 2002; Hardin & Preker, 2003).

As funções sociais também se diferem entre as duas estruturas organizacionais. Na administração direta esta função está subentendida, pois, devido ao tratamento ser “gratuito”, espera-se que atenda aos mais pobres. No entanto, é sabido que existem várias exceções. Estes estabelecimentos devem seguir regras e programas determinados pelo Governo Federal, que podem ter incentivo financeiro ou não. Nas OSS, os subsídios do governo são baseados nos custos reais de atendimento e os contratos estabelecem o desempenho, e podem, como é no que ocorre no Estado de São Paulo, fixar a localização em uma região de população mais carente (Jakab et al., 2002; Hardin & Preker, 2003).

Evidentemente, o modelo por OSS possui aspectos negativos que são alvo de críticas. Tonelotto et al. (2019) destacam que as exigências legais, por exemplo, a transferência de recursos às OSS em virtude da Lei de Responsabilidade Fiscal (2000), estariam minando a provisão direta dos serviços de saúde em benefício do setor privado e do terceiro setor. Pacheco (2004) enfatiza a possibilidade de falhas na supervisão do cumprimento de metas, ou então metas pouco ambiciosas, além de ausência de sanções para metas não cumpridas. Há ainda o risco de direcionamento na contratação da prestadora de serviço que não estejam relacionados a capacidade de realizar produção hospitalar de qualidade, mas sim de relacionamento com o poder público.

Deste modo, a base para que um contrato de gestão seja bem-sucedido é a transparência nas informações, combinado com uma confiabilidade dos dados e a participação direta da sociedade. Desta forma, o problema de agência, mais especificadamente a questão de assimetria de informações, é mitigada. O referencial teórico sustenta o argumento de que, havendo incentivos corretos, as OSS são mais eficientes. São capazes de produzir mais serviços hospitalares com uma menor quantidade de recursos. Este estudo parte desta hipótese para testar se esta afirmação se aplica em Santa Catarina.

2.1 Estudos sobre eficiência na saúde

No continente africano, Zere, Mcinture e Addison (2001) e Kirigia et al. (2008) avaliaram a eficiência técnica e a produtividade em hospitais da África do Sul e em Angola, respectivamente. No primeiro país foi verificado o impacto das características hospitalares sobre a eficiência e a produtividade hospitalar usando os modelos Tobit e de Regressão Linear. Os autores constataram que 87% dos hospitais foram ineficientes, no qual o nível de eficiência técnica foi o mesmo para todos. Os autores destacaram também que os níveis de ocupação e o número de atendimento ambulatorial como proporção dos dias de internação foram significativamente positivos e relacionados com a eficiência. Em relação ao estudo com hospitais da Angola, foi utilizado o modelo DEA orientado ao produto e as mudanças na produtividade foram mensuradas pelo índice de Malmquist. Os resultados indicaram que, em média, a produtividade dos hospitais analisados aumentou 4,5% no período de 2000 a 2002.

O modelo DEA foi utilizado por La Forgia e Couttolenc (2008) para analisar modelos de gestão e a relação entre tamanho dos hospitais brasileiros com eficiência. Os autores verificaram que o índice de eficiência médio de hospitais cresce à medida que o hospital suporta mais leitos. Hospitais com menos de 50 leitos apresentaram baixo escore médio de eficiência total, obtendo o valor de 0,30, aproximadamente. A pequena escala dos hospitais, segundo os autores, contribui para gastos mais elevados e qualidade mais baixa. Em Minas Gerais, por exemplo, os autores verificaram que houve muitos gastos com o tratamento hospitalar de casos de baixa complexidade, em vez de atendê-los em unidades básicas a custos menores, levando a uma alocação inadequada de serviços. A respeito de modelos de gestão, o método DEA permitiu aos autores concluir que diferentes arranjos organizacionais estão associados a diferente escores médios de eficiência. As OSS apresentam escores de eficiência altos, por vezes maiores do que os escores registrados em entidades com fins lucrativos. Em contraste, também se concluiu que os níveis de eficiência são muito baixos em hospitais públicos diretamente administrados pelo governo.

Destaca-se a pesquisa feita por Cesconetto, Lapa e Calvo (2008), que avaliaram a eficiência produtiva de 112 hospitais conveniados ao SUS no Estado de Santa Catarina. O objetivo dos autores foi verificar quais hospitais eram eficientes quanto ao uso dos recursos disponíveis. Para tanto, utilizou-se a abordagem DEA para retornos variáveis de escala, tendo como resultado que somente 23 dos 112 hospitais eram eficientes. Pelo modelo empírico definido, os autores afirmaram que o número de internações com altas poderia ser aumentado em 15% de acordo com o modelo DEA orientado para expansão da produção. Os autores também observaram que quando se aplica o modelo orientado aos insumos, o número de médicos, técnicos de enfermagem e auxiliares de enfermagem poderia ser reduzido em 25%, o número de leitos em 17% e o valor de AIH em 13% para a rede hospitalar em estudo.

Lobo et al. (2009) realizaram um estudo a partir da reforma administrativa e financeira realizada pelo Ministério da Saúde em 2004 para verificar as mudanças de desempenho e produtividade para os Hospitais Universitários Federais, nos anos de 2003 e 2006. A amostra foi composta por trinta hospitais gerais de ensino. Optou-se pelo método DEA, considerando retornos variáveis de escala e orientação ao input, e também foi calculado o índice de Malmquist para identificar mudanças de desempenho ao longo dos anos em termos de eficiência técnica e tecnológica. Os autores citam a expansão do aporte financeiro em 51% para os hospitais universitários no período analisado, e então encontra um aumento na eficiência técnica dos hospitais de ensino, mas o mesmo não acontecendo com a fronteira tecnológica. Concluíram que a reforma financeira melhorou a eficiência técnica dos hospitais analisados; mas sem evidência de ganhos tecnológicos. Isto significou que o aumento do orçamento era absolutamente necessário para melhorar a eficiência dos hospitais, mas a reforma permitiu apenas o desenvolvimento de melhorias de gestão.

Langabeer e Ozcan (2009) aplicaram o DEA e o índice de Malmquist com dados de 2002 a 2006 para definir e medir a eficiência técnica longitudinal dos principais centros de oncologia nos Estados Unidos. Número de leitos, número de funcionários e despesas operacionais foram os inputs considerados. Como output foi utilizado o número total de saídas ambulatoriais. Os autores chegaram a conclusão que os hospitais analisados não apresentaram incrementos significativos na eficiência técnica ao longo dos anos.

Trabalhos utilizando DEA para analisar hospitais são comuns internacionalmente. Chu et al. (2011) realizaram um estudo de eficiência para hospitais chineses que, devido a implementações de reformas dos cuidados de saúde no país na última década, buscou evidenciar empiricamente a ineficiência dos hospitais utilizando o modelo DEA e o índice de Malmquist. A partir de dados dos anos de 2004 a 2008 para 463 hospitais, foi identificado significativa ineficiência dos hospitais no período analisado. Conforme o autor, neste período houve um crescimento de produtividade no setor em virtude da mudança tecnológica.

O método DEA associado ao índice Malmquist também foi utilizado por Navarro-Espigares (2011) para analisar a relação entre qualidade e eficiência no setor público de saúde na Espanha. Considerou-se dados de 27 hospitais no período de 1997 a 2004, e os inputs escolhidos para o estudo foram: número de leitos, número de médicos, número de enfermeiros, e demais equipes do hospital. No lado do output, para o modelo básico, o autor utilizou o número de consultas, emergências e procedimentos ambulatoriais. Para o modelo de qualidade, as variáveis de output foram o tempo de permanência, um mix de casos atendidos, a taxa de utilização, a rotatividade do centro cirúrgico e um indicador de satisfação medido por uma pesquisa. Os autores concluíram que a eficiência técnica dos hospitais aumentou durante o período, assim como a qualidade do serviço. Devido a isto, o autor descarta a hipótese de que existe um trade-off entre eficiência e qualidade.

3 PERCURSO METODOLÓGICO

Para alcançar os objetivos da pesquisa, empreendeu-se uma análise descritiva, por meio de um estudo documental, com abordagem quantitativa. Nesse contexto, optou-se por efetuar a Análise Envoltória de Dados em três estágios. No primeiro, uma fronteira de eficiência é estabelecida com base nas Decision Making Units (DMU), que são os hospitais em análise. Em seguida é calculada a produtividade de cada unidade por meio do índice Malmquist, que decompõe a variação de eficiência em duas: a técnica e a tecnológica. No terceiro estágio é feita uma regressão em painel utilizando variáveis relacionadas a distribuição de custos por hospital. Para tanto, foi utilizado o pacote “rDEA” (SIMM e BESSTREMYANNAYA, 2016) do programa estatístico R (versão 3.3.3), para extrair os resultados da pesquisa.

No total o estado possui 18 hospitais em que a gestão é realizada por OSS ou pela administração direta (Quadro 1). Para estes, foram requeridas à Secretaria Estadual de Saúde de Santa Catarina as seguintes informações: Quantidade de leitos habilitados; Número de médicos; Número de enfermeiros; Número de técnicos de enfermagem; Número de auxiliares de enfermagem e auxiliares de serviços hospitalares; Número de funcionários de outras especialidades de saúde (bioquímico, nutricionista, odontologista, fisioterapeuta, farmacêutico, fonoaudiólogo e psicólogo); Outros funcionários que não se enquadram nos anteriores; Tempo médio de permanência; Número de atendimentos ambulatoriais; Número de atendimentos emergenciais; Número de internações; Número de cirurgias; Número de exames, incluído os Serviços de Apoio Diagnóstico e Terapêutico – SADT; Folha de pagamento; Gastos com serviços terceirizados; Despesas com medicamentos; Despesas com materiais de enfermagem; Despesas com alimentação; Despesas com lavanderia; Despesas com luz, água, telefone e internet. É importante destacar que para os dados solicitados se baseou nos estudos de Langabeer e Ozcan (2009), Kirigia et al. (2008), Navarro-Espigares (2011), entre outros.

Quadro 2: Relação dos hospitais catarinenses de gestão própria ou por organização social

Gestão Própria

Organização Social

Hosp. Regional Homero Gomes

Hospital Hans Dieter Schmidt

CEPON

Hosp. Doutor Waldomiro Colautti

Instituto de Psiquiatria

Hospital Terezinha Gaio Basso

Hospital Infantil Joana de Gusmão

Maternidade Dona Catarina Kuss

Hosp. Inf. Jeser Amarante Faria

Hospital Gov. Celso Ramos

Hospital Nereu Ramos

Hospital Florianópolis

Maternidade Darcy Vargas

Instituto de Cardiologia

Hospital Regional de Araranguá

Hosp. e Matern. Tereza Ramos

Hospital Santa Teresa

Maternidade Carmela Dutra

Fonte: Dados da SES. Elaboração própria.

Foram solicitados todos os dados mensais de janeiro de 2012 até o final do primeiro semestre de 2017, discriminados por unidade hospitalar para que, depois, fosse possível utilizar médias anuais no estudo de forma mais confiável. Com as informações obtidas, foi feita uma amostragem de confrontamento com os dados do Cadastro Nacional de Estabelecimento de Saúde (CNES) para se obter maior confiabilidade dos dados.

Devido ao fato de existir somente 18 hospitais públicos estaduais em Santa Catarina que utilizam os modelos de gestão em comparação no estudo, tem-se uma limitação no número de variáveis possíveis para utilização na Análise Envoltória de Dados. Como regra prática, Cooper et al. (2002) oferecem uma fórmula para estudos empíricos: n≥max{x*y;3(x+y)}, onde n corresponde ao o número de hospitais ou DMUs,; x é o número de inputs; e y é o número de outputs. Caso fossem utilizadas mais variáveis, poderia causar no modelo um problema de viés chamado de “super eficiência”. Este ocorre quando os escores de eficiência ficam inflados e conclui-se facilmente pela ótima alocação dos recursos hospitalares quando esta na realidade não ocorre. Para evitar este problema, optou-se por utilizar somente cinco variáveis (quatro inputs e um output) no presente estudo.

Como variáveis inputs foram escolhidos as quatro mais utilizadas e relevantes na bibliografia de DEA para saúde pública. São elas: Quantidade de leitos habilitados; Número de médicos ativos; Número de outros funcionários da saúde, sendo usada a média anual destas três variáveis; e Gastos por leito, que corresponde ao somatório de todos os dados de despesas obtidos para cada ano - folha de pagamento, serviços terceirizados, materiais médicos, medicamentos, alimentação, lavanderia, energia elétrica, água e telefone -, dividido pela quantidade da média anual de leitos habilitados.

Para que todos os serviços prestados pelos hospitais, independentemente de sua natureza, fossem considerados na modelagem DEA, na determinação do output, considerou-se uma ponderação dos pesos médios dos serviços hospitalares encontrada nos contratos de gestão das OSS do Estado de Santa Catarina, para definição das metas e custos para cada tipo de serviço hospitalar. O cálculo efetuado para a variável de output foi:

Output=(A*0,7)+(B*0,15)+(C*0,1)+(D*0,05)

Sendo:

A: Número de internações e número de cirurgias

B: Número de atendimentos emergenciais

C: Número de atendimentos ambulatoriais

D: Número de exames e SADTs .

Entretanto, alguns hospitais não possuem todos estes serviços. São eles: CEPON, que em 2012 não possuía ambulatório de intercorrência oncológica, então não possui dados de atendimentos emergenciais para o ano; Hospital Nereu Ramos, o qual não possui atendimentos emergenciais; Instituto de Psiquiatria, onde não há atendimentos ambulatoriais, nem cirurgias (embora possua internações); e Hospital Santa Tereza, que não possui atendimentos emergenciais, tampouco cirurgias. Para contornar este problema, foi feito uma ponderação proporcional para os serviços do hospital, desconsiderando a porcentagem do serviço não presente nele, e considerando todos outros como 100%. No caso de Hospital Nereu Ramos, por exemplo, o cálculo ficou:

Output=(A*0,8235)+(C*0,1176)+(D*0,5882)

Onde:

A: Número de internações e número de cirurgias

C: Número de atendimentos ambulatoriais

D: Número de exames e SADTs.

Todos os demais dados solicitados à Secretaria de Saúde do Estado de Santa Catarina e não mencionados acima como inputs ou output foram considerados na análise apresentada neste estudo. Eles foram utilizados na análise de dados em painel efetuada.

Quanto aos procedimentos, primeiramente elaborou-se uma matriz de correlações lineares de Pearson com as variáveis de input e de output selecionadas para verificar associação entre elas. Os valores de correlação que mais interessam para o DEA são dos inputs com a variável output, sendo que todas apresentaram correlação de moderada a alta. Cabe apontar que “Número de Médicos” foi o input que apresentou a maior correlação (0,87) com a produção, e “Gasto por leito” apresentou a menor correlação (0,42).

Ressalta-se a consistência da escolha da variável de produção por meio da análise de correlação entre esta variável e a soma dos principais gastos hospitalares. Esta correlação equivale a 0,73, considerada um valor ideal. A hipótese de consistência previamente estipulada seria atendida caso tivéssemos um valor alto de correlação, mas que não explicasse exclusivamente e por completo o gasto, uma vez que existem outros fatores que influenciam o produto hospitalar além do gasto médio para cada procedimento, como por exemplo, formas de gestão.

Antes de efetuar a análise envoltória dos dados, foram feitos testes de hipóteses de retornos de escala para cada ano em questão. Simar e Wilson (2002) elaboraram um teste estatístico com técnica de bootstrap capaz de concluir se o setor analisado apresenta retornos constantes ou variáveis de escala. Caso o p-valor do teste seja inferior ao nível de significância de 5%, rejeita-se a hipótese nula (retornos constantes de escala). Os resultados indicaram p-valores acima de 5% em todos os anos de análise, portanto a hipótese de que os hospitais estaduais de Santa Catarina operam com retornos constantes de escala foi aceita, isto é, crescimentos nos insumos e no produto tendem a acontecer de forma proporcional. Os resultados do modelo DEA em três estágios é apresentado na seção a seguir.

4 Resultados de eficiência da Análise Envoltória de Dados

As Tabelas 1 e 2 expõem de forma decrescente os escores de eficiência obtidos com o DEA para os hospitais estaduais no período de análise. Cabe tanto comparar os hospitais entre si quanto observar a evolução do escore de eficiência ao longo do tempo. Os resultados para 2017 refletem as informações do primeiro semestre, pois para os demais meses não havia dados disponíveis. No entanto, destaca-se que no modelo DEA isto não distorce o resultado, contanto que todas as DMUs possuam o mesmo corte temporal. Além disso, devido a inconsistência nos dados recebidos, foram excluídos da análise em 2012 os hospitais Florianópolis e Regional de Araranguá. Em 2013 somente o Hospital Florianópolis foi desconsiderado.

Tabela 1: Escores de eficiência dos hospitais de gestão própria (2012 a 2017)

Hospitais

2012

2013

2014

2015

2016

2017

Média

Hosp. Regional Homero Gomes

1,00

0,90

0,87

0,98

1,00

1,00

0,96

Hosp. Doutor Waldomiro Colautti

0,70

0,81

0,75

1,00

0,88

0,81

0,82

Hospital Infantil Joana de Gusmão

0,57

0,65

0,62

0,69

0,83

0,83

0,70

Hospital Gov. Celso Ramos

0,54

0,55

0,62

0,70

0,81

0,78

0,67

Maternidade Darcy Vargas

0,61

0,52

0,56

0,67

0,66

0,66

0,61

Hosp. e Matern. Tereza Ramos

0,87

0,36

0,38

0,45

0,52

0,54

0,52

Maternidade Carmela Dutra

0,48

0,44

0,44

0,54

0,48

0,51

0,48

Hospital Hans Dieter Schmidt

0,47

0,43

0,43

0,45

0,51

0,48

0,46

Instituto de Psiquiatria

0,27

0,35

0,46

0,54

0,46

0,49

0,43

Maternidade Dona Catarina Kuss

0,16

0,26

0,24

0,37

0,25

0,28

0,26

Hospital Nereu Ramos

0,18

0,23

0,26

0,29

0,26

0,27

0,25

Instituto de Cardiologia

0,17

0,21

0,22

0,28

0,26

0,25

0,23

Hospital Santa Teresa

0,09

0,17

0,19

0,27

0,22

0,24

0,20

Fonte: Dados da SES. Elaboração própria.

A unidade hospitalar gerida pela administração direta mais eficiente é o Hospital Regional Homero de Miranda Gomes, com média de 0,958 de eficiência e com índices totais nos anos de 2012, 2016 e 2017. O ano em que este hospital mostrou seu índice de eficiência mais baixo foi 2014, recuperando a eficiência máxima até 2016. Hospital Doutor Waldomiro Colautti, o segundo da lista, atingiu a eficiência relativa máxima em 2015, mas vem caindo desde então, mesmo que ainda esteja apresentando resultados melhores do que seus resultados em 2012 a 2014.

O terceiro hospital mais eficiente para este modelo de gestão é o Hospital Infantil Joana de Gusmão, com média equivalente a 0,700. Sua melhora na eficiência relativa foi quase constante entre o período, indo de 0,574 em 2012 para 0,833 em 2017. Entretanto, o Hospital Infantil Jeser Amarante Faria, gerido por uma OSS e possui o mesmo foco de atuação, foi mais eficiente que o Joana de Gusmão em todo o período analisado.

Em relação aos hospitais da administração direta de pior resultado, a Maternidade Dona Catarina Kuss, com escore médio de 0,260, foi a maternidade menos eficiente dentre as de gestão estadual de Santa Catarina. Em 2012, ela apresentou um índice de eficiência de somente 0,164, e embora tenha se tornado mais eficiente desde então, no primeiro semestre de 2017, sua eficiência foi de somente 0,283. O Hospital Nereu Ramos, antepenúltimo da lista, demonstrou melhora no seu escore de eficiência entre 2012 e 2015, depois retornando a decrescer.

O penúltimo hospital de gestão estadual de pior eficiência do estado, com escore médio de 0,232, o Instituto de Cardiologia teve seu escore de eficiência oscilando entre 0,171 e 0,284. Por fim, o hospital estadual catarinense mais ineficiente é o Santa Teresa, obtendo o menor escore da análise em 2012 (0,094). Embora este hospital venha apresentando uma tendência crescente na eficiência relativa, chegando a 0,241 em 2017, ainda assim podemos afirmar que, de acordo com os parâmetros utilizados, é o hospital mais ineficiente de gestão estadual.

É intrigante observar que hospitais geridos pela administração direta possuem desempenho tão distintos. Embora não possa explicar totalmente a diferença, peculiaridades interferem no resultado. O melhor colocado, o Hospital Regional Homero de Miranda Gomes, está localizado próximo a rodovia de maior movimento do estado. Ele recebe diversos acidentados em que o atendimento é realizado com urgência, portanto sua eficiência reflete tal situação.

Tabela 2: Escores de Eficiência dos hospitais geridos por OS (2012 a 2017)

Hospitais

2012

2013

2014

2015

2016

2017

Média

CEPON

1,00

1,00

1,00

1,00

1,00

1,00

1,00

Hospital Terezinha Gaio Basso

1,00

1,00

1,00

1,00

1,00

1,00

1,00

Hosp. Infan. Jeser Amarante Faria

0,95

0,92

0,86

0,93

1,00

1,00

0,94

Hospital Florianópolis

-

-

0,91

1,00

0,93

0,91

0,94

Hospital Regional de Araranguá

-

0,79

0,82

0,91

0,98

0,89

0,88

Fonte: Dados da SES. Elaboração própria

Em relação às unidades hospitalares geridas por OSS, o CEPON e o Hospital Teresinha Gaio Basso são os hospitais públicos estaduais mais eficientes da amostra analisada, apresentaram valores máximos de eficiência relativa em todos os anos. Os outros três hospitais também geridos por organizações sociais obtiveram elevados escores de eficiência, sendo 0,789 o menor valor do período analisado. Apesar dos hospitais Florianópolis e o Regional de Araranguá terem os piores resultados do grupo, eles foram superiores em termos de eficiência aos hospitais da administração direta, com exceção de um deles. Os hospitais geridos por OSS alcançaram escores significativamente superiores aos hospitais geridos pela administração direta. Isto ocorre em todos os anos analisados no estudo.

Antes da apresentação dos resultados dos índices de Malmquist e de dados em painel, foram efetuados testes de consistência para validar o modelo e a escolha das variáveis presentes nele. Técnicas de bootstrap foram propostas por Simar e Wilson (2011) para o cálculo dos escores de eficiência do DEA. Estes métodos, embora ainda raramente utilizadas na literatura pertinente, foram estudadas e testadas na presente pesquisa. Constatou-se que os resultados obtidos pelas duas técnicas não diferiram, o demonstra a robustez do modelo.

Também foram testadas possíveis variações no cálculo das ponderações das produções hospitalares utilizadas no cálculo do output total. Mais uma vez, encontrou-se consistência dos resultados, uma vez que as conclusões e os rankings dos hospitais por escores de eficiência se mantiveram estáveis quando comparados ao modelo com o output original deste estudo.

5 ÍNDICE DE MALMQUIST E RESULTADO DA ANÁLISE EM PAINEL

O índice de Malmquist-DEA permite analisar mudanças temporais de produtividade total dos fatores de produção em termos de alterações de eficiência técnica e em termos de mudanças tecnológicas. Sua relevância é poder identificar se as mudanças na produtividade ao longo do tempo foram devido as mudanças internas ou a mudanças externas que afetam todo o setor. O índice de Malmquist equivale a multiplicação das eficiências técnicas e da eficiência tecnológica. Foi efetuada a análise a partir de dados de 2014, ano em que a amostra passa a conter todos os 18 hospitais estaduais. Por meio da Tabela 3 são apresentados os valores médios dos três índices analisados para cada hospital durante o período de 2014 a 2017.

Tabela 3: Média dos índices Malmquist, eficiência técnica e tecnológica

Hospital

Malmquist

Ef. Técnica

Ef. Tecnológica

Hospital Santa Teresa

1,113

1,122

1,046

Hospital Infantil Joana de Gusmão

1,081

1,105

0,979

Hospital Governador Celso Ramos

1,050

1,082

0,973

Maternidade Dona Catarina Kuss

1,039

1,112

1,017

Instituto de Psiquiatria

1,038

1,026

1,038

CEPON*

1,032

1,000

1,032

Hosp. e Maternidade Tereza Ramos

1,028

1,128

0,915

Hosp. Infantil Jeser Amarante Faria*

1,019

1,053

0,97

Maternidade Carmela Dutra

1,016

1,059

0,972

Instituto de Cardiologia

1,014

1,057

0,982

Hosp. Regional Homero de M. Gomes

1,004

1,048

0,96

Hospital Doutor Waldomiro Colautti

0,986

1,045

0,981

Maternidade Darcy Vargas

0,984

1,062

0,933

Hospital Nereu Ramos

0,976

1,004

0,983

Hospital Hans Dieter Schmidt

0,96

1,041

0,925

Hospital Florianópolis*

0,956

1,002

0,958

Hospital Terezinha Gaio Basso*

0,951

1,000

0,951

Hospital Regional de Araranguá*

0,938

1,033

0,913

Média

1,011

1,054

0,974

Fonte: Elaboração própria. *Hospitais geridos por OSS.

De acordo com o método de Malmquist, a produtividade total de fatores cresceu, em média, 1,1% ao ano entre 2014 e 2017. Este ganho na produtividade dos hospitais deve-se a um aumento na eficiência técnica (interna) de 5,4%. Por outro lado, a eficiência tecnológica apresentou uma redução de 2,6%, isto é, houve um deslocamento da fronteira de eficiência para dentro, ou seja, fatores externos prejudicaram a produção como um todo.

Enquanto que administrativamente os hospitais catarinenses analisados estão melhor utilizando os recursos a sua disposição, não tem havido um incremento tecnológico que promova a eficiência. Este resultado negativo é similar ao observado por Lobo et al. (2009) e por Costa, Balbinotto Neto e Sampaio (2014) ao pesquisar sobre a eficiência de hospitais-escola e sistemas de transplante renal no Brasil, respectivamente. Um dos indicativos para tal situação é a defasagem tecnológica nas unidades que acarreta na não adoção de técnicas inovadoras e mais produtivas.

O Hospital Santa Teresa apresentou o maior aumento de produtividade no período (11,3%), mesmo apresentando baixo escore de eficiência no DEA. De acordo com a Secretaria Estadual da Saúde, parte desta elevação da eficiência técnica é atribuída a ele ter acumulado funções antes realizadas pelo Hospital Regional Homero de Miranda Gomes. O Hospital Nereu Ramos, outra unidade com resultado de eficiência ruim no DEA, não apresentou o mesmo aumento de produtividade que o Santa Teresa. Seu índice Malmquist médio no período foi inferior a 1, equivalente a 0,976.

Os 3 menores índices médios de Malmquist foram hospitais geridos por OSS (Regional de Araranguá, Teresinha Gaio Basso e Florianópolis), tendo todos valores inferiores a unidade. CEPON, mesmo obtendo escores máximos de eficiência no DEA em todos os anos, ainda conseguiu melhorar sua produtividade total de fatores em 3,2% entre 2014 e 2017. Esta melhoria se deve a eficiência tecnológica, e não a eficiência interna, que se manteve constante em todo o período.

Hospitais com baixos escores de eficiência apresentaram valores maiores nos índices de evolução de eficiência em comparação com os hospitais com altos escores de eficiência. Conclui-se então que, no geral, está havendo uma convergência (catching up) na gestão da eficiência dos hospitais. Mas como exceções, se destacam positivamente o CEPON e negativamente o Hospital Nereu Ramos.

Na análise em painel foi ajustado um modelo linear de efeito misto, com efeito aleatório no intercepto e na inclinação, de forma a obter o crescimento ou decrescimento da eficiência ao longo do tempo em cada hospital. O efeito aleatório na inclinação foi testado e confirmado utilizando o teste de razão de verossimilhança, evidenciando a importância de permitir a inclinação variar por hospital. Para este modelo, foi isolado e considerado como variável explicativa somente o tempo, como efeito fixo. Truncou-se o período base em 2017 para efetuar a primeira análise. Neste ano, o escore médio de eficiência foi de 0,676. O Gráfico 1 apresenta intervalos de confiança dos escores de eficiência de 2017 para os 18 hospitais.

Gráfico 1: Intervalos de confiança para o intercepto dos hospitais

Fonte: Elaboração própria.

Pela técnica de dados em painel, pode-se afirmar quais hospitais estão estatisticamente acima da média em termos de eficiência de 2017, e quais estão abaixo da média. O Gráfico 1 evidencia que, com exceção da Maternidade Darcy Vargas, todos hospitais são estatisticamente diferentes da média, a um nível de significância de 5%. CEPON e o Hospital Teresinha Gaio Basso são os hospitais positivamente mais distantes estatisticamente da média.

Ao avaliar o efeito fixo, houve um crescimento médio entre 2012 e 2017 de 1,9% nos escores de eficiência a cada ano (valor próximo ao encontrado no Índice Malmquist). O p-valor de 0,001 confirma a significância estatística da evolução na eficiência dos hospitais catarinenses. O Gráfico 2 apresenta os crescimentos de eficiência entre 2012 e 2017 para cada hospital, a um nível de significância de 5%.

Gráfico 2: Intervalos de confiança para a inclinação dos hospitais

Fonte: Elaboração própria.

A partir de uma análise individual, percebe-se que o Instituto de Psiquiatria e os hospitais Santa Teresa, Infantil Joana de Gusmão, Governador Celso Ramos e Doutor Waldomiro Colautti foram as unidades que apresentaram intervalos de confiança que não contém zero. Isto é, estes são os hospitais que apresentaram melhoria estatisticamente significantes na eficiência durante o período analisado. O Hospital e Maternidade Tereza Ramos foi o único cujo valor central do intervalo de confiança se encontra abaixo de zero. Entretanto, não podemos afirmar com confiança estatística que houve queda na eficiência neste hospital, uma vez que o intervalo de confiança contém zero.

Para calcular uma medida de ajuste entre a variável tempo e os escores de eficiência do DEA, foi efetuado um cálculo de R2 entre os valores estimados do modelo e os valores reais. Encontrou-se um R2 equivalente a 2,04%, o que significa que somente 2,04% da variância nos dados de escores de eficiência são explicados pela variável tempo.

6 CONSIDERAÇÕES FINAIS

No Brasil, ampliação dos serviços à sociedade é sinônimo de aumento das despesas públicas. O anúncio de novos serviços pelos governantes é seguido por incrementos nas despesas e, na maioria das vezes, ausente de uma análise criteriosa sobre o retorno à população que será obtido. Este contexto tem sido alterado devido a recorrente frustação de receitas após a crise econômica brasileira, de modo que a qualidade das despesas, ou seja, aquelas com retornos mais eficientes, tem sido valorizada. No Estado de Santa Catarina o cenário é igualmente desafiador. A deterioração da situação fiscal dificulta incrementos no orçamento da saúde, enquanto que a demanda por estes serviços – decorrência natural do envelhecimento populacional – é crescente.

Muitos são os benefícios da existência de transparência e de indicadores para avaliar a gestão pública presentes nos modelos hospitalares geridos por OSS. Os Contratos de Gestão, quando elaborados corretamente, seguem nesta direção. A sociedade possui maior controle social sobre a execução, o que diminui os riscos do sistema, ampliando a oferta de serviços públicos ao cidadão. Evidentemente que o modelo de OSS não é isento de falhas. Os problemas de agência, embora menores que em hospitais de administração direta, continuam presentes. Os Contratos de Gestão precisam ser executados com constante fiscalização tanto pelo Poder Público quanto pela sociedade, que deve participar de perto de todas as etapas. Quanto à fiscalização pública, as secretarias estaduais responsáveis pela supervisão dos contratos necessitam de estrutura adequada para verificar a execução dos contratos, medir as produções e estabelecer metas realistas que avaliem o potencial de produção de cada hospital. Sabe-se que isso ainda não ocorre de forma satisfatória.

Há um desafio em aperfeiçoar regras e a governança da gestão pública estadual em hospitais, reduzindo a possibilidade de ações discricionárias que não ampliam o serviço de saúde ao cidadão e a concessão de atos que beneficiam apenas a alguns grupos de interesse, que nem sempre vão ao encontro do bem comum. O trabalho demonstrou que modelo de OSS é o que mais se aproxima de maximizar a entrega de serviços hospitalares ao cidadão, utilizando menor quantidade de insumos.

Para extrair afirmações sobre os modelos de gestão e os hospitais públicos estaduais, foram feitas análises estatísticas capazes de gerar conclusões acerca dos pontos levantados no início do estudo. Os escores de eficiência foram superiores nas OSS em relação aos outros hospitais, sendo que 60% das OSS atingiram escore máximo em 2017. Somente um hospital da administração direta atingiu o mesmo índice. Foram encontradas evidências que atribuem a evolução na eficiência dos hospitais à melhoria na eficiência técnica (interna), enquanto houve redução na variação da eficiência tecnológica (externa), isto é, a fronteira de possibilidades de produção apresentou recuo entre 2014 e 2017. Pela análise de dados em painel, utilizando escores de eficiência como variável resposta, constatou-se um aumento médio de 1,9% na produtividade total de fatores entre 2012 e 2017, sendo que somente o Hospital e Maternidade Tereza Ramos apresentou valor médio de evolução de produtividade inferior a zero.

Do ponto de vista teórico, o estudo contribui para a literatura de administração pública por aprofundar a discussão sobre eficiência em hospitais públicas na perspectiva de diferentes modelos de gestão. Da mesma forma, o estudo agrega evidência práticas a partir de um estudo empírico com hospitais catarinenses. Quanto as limitações do estudo, é importante ressaltar que o modelo DEA apresenta resultados considerando as variáveis utilizadas, portanto não necessariamente um hospital é melhor do que o outro. Há os indicadores não observados, como a qualidade do serviço e as reinternações, por exemplo. Para pesquisas futuras sugere-se a inclusão de variáveis qualitativas no modelo, bem como realizar uma pesquisa em profundidade para analisar como a gestão interna destas unidades hospitalares influenciam a prestação do serviço.

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1 felipenosul@gmail.com. Universidade do Estado de Santa Catarina-Florianópolis, Brasil. https://orcid.org/0000-0001-9582-7438

2 sbs3y@virginia.edu.br. Tribunal de Contas de Santa Catarina - Florianópolis, Brasil. https://orcid.org/0000-0003-4490-7598

3 fabianoraupp@hotmail.com. Universidade do Estado de Santa Catarina- Florianópolis, Brasil. http://orcid.org/0000-0001-9533-2574

DOI: http://dx.doi.org/10.14392/asaa.2020130104

Artigo submetido em: 13/09/2019. Revisões requeridas em: 14/01/2020. Aceito em: 20/01/2020